Paulo Guedes

SÃO PAULO – A derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que impedia a concessão de reajustes a algumas carreiras do funcionalismo público até o fim de 2021, no Senado Federal, pegou integrantes do Palácio do Planalto de surpresa e será o primeiro grande teste para o deputado Ricardo Barros (PP-PR) na condição de novo líder do governo na Câmara dos Deputados.

Experiente articulador, com bom conhecimento dos meandros do parlamento e das brechas regimentais, o parlamentar terá de correr contra o relógio para evitar que 257 deputados sigam o mesmo caminho dos 42 senadores que votaram pela rejeição do dispositivo. A sessão está marcada para as 15h (horário de Brasília) desta quinta-feira (20) e será acompanhada de perto pelo mercado.

O veto em análise é considerado por agentes econômicos uma espécie de garantia de compromisso fiscal do governo federal em meio à expansão nos gastos públicos provocados pela crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.

Sua derrubada pode afetar a credibilidade do país e agravar a situação das contas públicas em um momento em que se estima que a dívida bruta atinja a marca de 95% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano. O Ministério da Economia chegou a estimar que o veto poderia garantir uma economia fiscal entre R$ 121 bilhões e R$ 132 bilhões.

Nesta tarde, o governo testará sua força ante corporações do serviço público (mesmo que também conte com a simpatia de governadores preocupados com a pressão política e os impactos sobre os cofres estaduais de uma eventual rejeição do veto) e a fidelidade dos novos aliados do “centrão” em uma votação de forte apelo a menos de três meses das eleições municipais.

O impedimento de reajustes de salários de servidores era parte de acordo entre o governo federal e representantes de estados e municípios, como contrapartida para o repasse de R$ 120 bilhões no pacote de socorro para o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, em um quadro de perda de arrecadação dos entes.

Para além do potencial impacto sobre as contas públicas, uma eventual confirmação da rejeição ao veto pelos deputados poderia ser uma sinalização eloquente das dificuldades enfrentadas pelo governo em retomar o debate sobre ajuste fiscal e mostrar em atitudes sua capacidade de cumprir com o teto de gastos.

Mas mesmo que o governo consiga uma vitória com a manutenção do veto, não se pode ignorar o fato de que os senadores, ao autorizarem a concessão de reajustes a profissionais de segurança pública, saúde e educação na pandemia, no mínimo provocaram muitas dúvidas sobre a disposição em fazer avançar um tema considerado fundamental para o futuro do teto.

Em meio aos recentes embates envolvendo um possível furo da regra nos próximos anos, a equipe econômica construiu uma estratégia para tentar garantir a sustentabilidade da âncora fiscal. O plano consiste inicialmente em rebaixar o piso, permitindo cortes em despesas obrigatórias e o acionamento de “gatilhos” para evitar o estouro do teto.

O receituário não é novo: a ideia seria reaproveitar duas PECs (Propostas de Emenda à Constituição) da chamada agenda Mais Brasil – apresentada em novembro do ano passado pelo ministro Paulo Guedes para tramitar no Senado Federal, mas que desde então pouco avançou. São elas a PEC Emergencial e a PEC do Pacto Federativo.

Vale lembrar: 1) PECs exigem maioria de 3/5 (ou seja, 308 deputados e 49 senadores), com dois turnos de votação em cada casa legislativa; 2) os parlamentares têm uma pauta extensa para analisar, que vai da peça orçamentária, passando pela reforma tributária e uma possível prorrogação do auxílio emergencial; 3) e estamos a 12 semanas do primeiro turno das eleições municipais.

Poucas horas após a votação do veto, Guedes disse que o Senado deu “um péssimo sinal” de que recursos para a crise podem se transformar em aumento de salários e classificou a decisão como “um crime contra o país”. O mesmo Senado que supostamente deve iniciar o debate sobre as propostas de rebaixamento do piso.

“Se as corporações continuarem com tanta força na comparação com o governo, votar gatilhos para o teto de gastos será um desafio bastante duro”, observa a equipe de análise política da XP Investimentos.

O veto a ser apreciado pelos deputados nesta tarde refere-se a parte de um pacote de socorro financeiro a estados e municípios, negociado pela equipe econômica com o parlamento no primeiro semestre. Uma das contrapartidas exigidas por Guedes foi justamente o congelamento de salários de servidores até o fim de 2021.

Durante a apreciação da proposta na Câmara dos Deputados, no entanto, o então líder do governo na casa, major Vitor Hugo (PSL-GO), articulou um texto, com o endosso do próprio presidente, para excluir algumas corporações da restrição. A ação gerou forte incômodo na equipe econômica e a pressão fez com que Bolsonaro assumisse o compromisso de vetar o trecho.

O veto levou dias para se confirmar. Bolsonaro usou o prazo máximo de sanção da lei para cumprir a promessa, o que permitiu reajustes de última hora a servidores, como no caso das forças de segurança do Distrito Federal. Sinalizações ambíguas do presidente também geram preocupação sobre a viabilidade da agenda fiscal.

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