A Justiça gaúcha condenou a seis anos de prisão, em regime inicialmente semiaberto, o ex-delegado da Polícia Civil Moacir Fermino, por falsidade ideológica e corrupção de testemunhas em uma investigação polêmica realizada em 2017. Ele teria cometido os crimes ao manipular o inquérito sobre o caso de dois corpos de crianças encontrados esquartejados em Novo Hamburgo (Vale do Sinos).

Cabe recurso da decisão e o agente só poderá ser preso após o trânsito em julgado (quando se esgotam todas as possibilidades de recurso por parte de defesa e acusação). Ele já está aposentado da corporação.

Na época, ele vinculou as mortes das crianças – cujas identidades permanecem desconhecidas – a um ritual satânico, versão que posteriormente seria rechaçada pela própria corporação. Ao todo, sete pessoas chegaram a ser indiciadas, das quais cinco acabaram presas e depois libertadas.

O MP (Ministério Público) apontou que Fermino cometeu, de forma deliberada, uma série de informações e declarações falsas nos relatórios de investigação. Ele chegou a dizer, inclusive em coletivas de imprensa sobre o caso, que havia recebido as dicas a partir de “revelações divinas”.

Ainda de acordo com a promotoria, o então delegado prometia a testemunhas a inclusão em programa de proteção policial (que prevê contrapartidas como residência, alimentação e ajuda de custo), desde que mentissem em depoimento. Ao menos quatro delas teriam participado da irregularidade.

“As consequências do delito praticado e as circunstâncias gerais exigem um aumento considerável de pena, pois os crimes [do agente de segurança pública] ocorreram durante inquérito policial e afetaram o curso da investigação sobre o homicídio de duas crianças”, ressaltou o juiz responsável pela decisão.

Também denunciado pelo MP, um dos informantes de Fermino foi condenado por participar da corrupção ativa de testemunhas. Pena: quatro anos e dois meses de cadeia, a serem cumpridos primeiramente em regime semiaberto. Um inspetor da Polícia Civil, porém, acabou absolvido.

Relembre

O caso começou há mais de três anos, quando os corpos esquartejados de um menino e de uma menina foram achados em Novo Hamburgo, em diferentes lugares e dias ao longo do mês de setembro. Na época, a análise genética atestou serem filhos da mesma mãe e terem idades aproximadas, respectivamente, de 8 e 12 anos. A necropsia apontou indícios da ingestão de largas quantidades de bebida alcoólica.

Como o então titular a Delegacia de Homicídios de Novo Hamburgo, Rogério Baggio, estava de férias, a investigação ficou a cargo de Moacir Fermino, dando início a um inquérito marcado por polêmicas, contradições e lances inusitados.

No começo do ano seguinte, o delegado foi a público atribuir o crime a uma suposta “seita satânica”. Indagado pela imprensa sobre a fonte da informação, ele respondeu: “Recebi de dois profetas que me trouxeram tal revelação”.

Com suspeitos já indiciados e presos, o caso acabou voltando aos cuidados do delegado titular Rogério Baggio, que poucas semanas depois se encarregaria de desmentir a versão: “Trata-se de uma farsa, é mentira, com a ajuda de testemunhas que mentiram em depoimento”.

(Marcello Campos)