Por Redação O Sul | 31 de agosto de 2020

Não bastasse o processo de impeachment do qual o prefeito de Porto Alegre é alvo na Câmara de Vereadores, a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Casa sobre a gestão de Nelson Marchezan Júnior aprovou nesta segunda-feira (31) um relatório final recomendando o seu indiciamento por advocacia administrativa, tráfico de influência, improbidade administrativa, corrupção passiva, dispensa de licitação e conflito de interesses.

O relatório foi aprovado com oito votos favoráveis, dois contrários e uma abstenção. Instalada em outubro de 2019, a CPI investigou fatos relacionados às denúncias apresentadas na quinta solicitação de abertura de processo impeachment contra o prefeito. O pedido acabou rejeitado pelo Plenário em setembro de 2019, mas as denúncias nele contidas resultaram na abertura da Comissão, um mês depois.

Com prazo de duração de até 180 dias (120 dias prorrogados por mais 60), a Comissão teve os trabalhos interrompidos de 17 de março a 22 de junho deste ano em função da pandemia causada pelo novo coronavírus, além dos períodos de recesso parlamentar. Foram realizadas 21 reuniões, 54 requerimentos de oitivas e pedidos de informação a órgãos públicos e empresas, além da oitiva de quatro testemunhas.

Também foram indiciados o secretário municipal de Relações Institucionais, Christian Wyse de Lemos, e o empresário Michel Costa, que foi diretor da Procempa e presidente do Conselho de Administração da Carris. Lemos teve recomendação de indiciamento por falso testemunho com relação ao Banco de Talentos e o empresário Michel Costa por tráfico de influência.

O presidente da CPI, Roberto Robaina (PSol), destacou o “esforço de resistência para que a CPI fosse até o final” e lamentou o suposto “boicote” da prefeitura às investigações. “Tivemos até o dia de hoje uma tentativa de obstrução por vereadores que representam o governo municipal”, afirmou. “A pandemia prejudicou as oitivas mas não impediu a investigação exaustiva dos documentos.”

Detalhes

Integraram as investigações denúncias relativas ao Banco de Talentos; ao favorecimento ilegal de empresas no transporte público municipal por Michel Costa; e a irregularidades na locação, pela Prefeitura, de um prédio na avenida Júlio de Castilhos para abrigar a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico.

Dos três itens analisados, foi constatada a prática de crime nos dois primeiros, não sendo identificado ato ilícito no aluguel de prédio para o funcionamento de órgãos públicos.

Conforme o relatório, foi possível verificar diversas irregularidades no contrato celebrado junto à entidade Comunitas (responsável pela implementação do Banco de Talentos), bem como a utilização do mecanismo de seleção para enfoque diverso do anunciado à sociedade.

Para o relator da comissão, Professor Wambert (PTB), “a novidade aparentemente positiva acabou por ser utilizada para interesses obscuros: desrespeitou o rito da licitação, contratou metade dos chamados voluntários causando gastos a administração pública e utilizou o meio para camuflar contratações políticas que implicaram em demissões arbitrárias posteriormente”.

O relator destacou que acordos de cooperação junto a entidades civis não podem dispensar o chamamento público quando há o compartilhamento de estrutura ou de qualquer recurso patrimonial público. No entanto, a Comunitas utilizou estrutura pública para a realização do acordo, tendo à sua disposição inclusive espaço físico no gabinete do prefeito.

Outro ponto apresentado foi a contratação pela prefeitura, em cargo em comissão, de sete dos 14 entrevistadores voluntários da Comunitas logo após a firmação do acordo. A CPI constatou que o acordo de cooperação iniciou em 1º de fevereiro e no mesmo mês passaram a ocorrer as contratações dos voluntários que atuavam na instituição. “Como se deu o processo de escolha? Quem entrevistou os entrevistadores?”, questionou Wambert.

O relatório também apontou que o Banco de Talentos é uma “fraude técnica, administrativa e política”, já que seu objetivo real não foi a contratação de profissionais de acordo com quesitos técnicos, mas sim políticos.

“O Banco de Talentos dava uma manto de tecnicidade para contratações meramente políticas”, afirma o documento, destacando, ainda, as exonerações de filiados indicados por partidos políticos que saíram da base do governo como prova de que as relações políticas eram determinantes para a ocupação dos cargos, em detrimento da competência técnica.

(Marcello Campos)

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